Agronegócios

Arroz: produtor não é vilão pela alta dos preços; entenda por quê

Foto: Canal Rural

Duzentas e dezessete mil propriedades rurais deixaram de produzir arroz entre 2006 e 2017, segundo o Censo Agropecuário. Isso representa queda de 54% nos estabelecimentos que trabalhavam com o cereal.

A baixa rentabilidade da produção é um dos fatores que explicação a migração dos rizicultores para outras culturas. Segundo Bruno Lucchi, superintende técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, dados do Projeto Campo Futuro mostram que o produtor de arroz teve prejuízos entre R$ 900 e R$ 2.500 da safra 2014/2015 até a temporada 2018/2019.

“Cinco safras consecutivas em que o produtor mal conseguia cobrir seus desembolsos. Margem bruta ele conseguiu até ter, em que pese dois anos negativos também. Mas o custo que ele tem com as depreciações dos equipamentos, de benfeitorias, de máquinas como um todo, ele não conseguiu suprir. Não conseguiu remunerar atividade. Produtor foi se endividando. Mesmo com o resultado positivo em 2019/2020 não foi suficiente para compensar. Então ou produtor sai da atividade ou se endivida ao extremo”, conta Lucchi.

Com produtores saindo da atividade, a área plantada no Brasil caiu. Do início da série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2006 até agora, o recuo foi de 44%. A produção também diminuiu, chegando a 11 milhões de toneladas na última temporada, terceiro menor volume já registrado.

O recuo da oferta e a firmeza das demandas interna e externa fizeram o preço do arroz disparar em 2020. No mercado doméstico, o auxílio emergencial dado pelo governo injetou renda nas famílias, o que aumentou a procura por alimentos. Já no mercado externa, a alta do dólar deixou o produto brasileiro mais competitivo, e as exportações cresceram.

A soma desses fatores fez o preço do arroz sair de R$ 48 por saca e atingir o inédito patamar de mais de R$ 100 por saca. Com isso, o cereal liderou a alta dos alimentos no índice da inflação. Mas isso não faz dele o vilão.

A inflação geral ao consumidor está acomodada em 0,7%. O último relatório Focus, do Banco Central, projeta 1,94% para o acumulado de 2020. O pesquisador da FGV Agro Felippe Serigati, afirma que a inflação está baixa para os padrões do Brasil. “Em outras palavras, provavelmente daqui a seis meses não estaremos conversando sobre isso. E de outro lado, a inflação de alimentos não contamina preço de outros produtos”, pontua.

Preocupado com a alta de alimentos da cesta básica, o governo interveio e decidiu facilitar a importações de arroz. Ficou autorizada, até 31 de dezembro, a entrada de 400 mil toneladas vindas de fora do Mercosul sem Tarifa de Externa Comum (TEC). “Abrimos somente uma cota, porque não temos necessidade de muito arroz. É uma cota de reserva para que tenhamos tranquilidade de que o preço vai voltar a ser equilibrar e não faltará arroz na gôndola dos brasileiros”, diz a ministra da Agricultura, Tereza Cristina.

Mesmo com o preço do arroz mais alto, produtores esclarecem que uma pequena parcela consegue aproveitar o pico dos preços e melhorar a rentabilidade, segundo o presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Alexandre Velho. “A rentabilidade aumentou para aqueles produtores que ainda tem produto disponível. Isso são, no máximo, 20% dos produtores. E mesmo esses produtores que agora estão vendendo a R$ 100 reais arrancaram o ano na safra vendendo a R$ 45. Então, o preço médio de venda desses produtores não chega nem perto de R$ 100”, afirma.

“Boa parte dos produtores antecipa sua venda para o cerealista ou com a indústria, porque ele tem poucos recursos disponíveis na mão dele. Então parte dessa produção já foi comprometida, e o produtor não consegue ter esse ganho observados nos últimos meses”, afirma o pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) Mauro Osaki.

Na última análise da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o governo destaca queda nos estoques, atualmente ao redor de 450 mil toneladas para o fim de 2020. De acordo com o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), Mario Pegorer, o volume está ajustado à demanda. “Baseado nos volumes que já saíram do Brasil e nas estatísticas de produção que temos, temos arroz para chegar na próxima safra”, diz.

Segundo o pesquisador do Cepea Lucílio Alves, a entidade está elaborando um estudo sobre a composição do preço do arroz. “Para mostrar como o choque no campo acaba sendo transferido para o consumidor. O que consigo dizer, por enquanto, é que ao longo dos meses a margem do arroz beneficiado diminuiu em relação ao arroz em casca. Nem toda a alta no campo foi repassada ao produto beneficiado”, diz.

Assim, o preço ao consumidor ainda deve registrar alta, avisa a Abiarroz. “Os preços que estamos vendo hoje, do ponto de vista de venda, não estão refletindo os preços de aquisição [junto ao produtor]. Arroz no mercado ainda vai subir. Toda alta ainda não chegou ao consumidor final. Custo na gôndola hoje reflete preço de aquisição do produtor 30 dias atrás”, afirma Pegorer.

Lucílio Alves acredita que os preços em 2021 devem ser diferentes dos observados este ano. “O mercado, aparentemente, tende a equilibrar oferta e demanda em patamares superiores que talvez mantenham a rentabilidade para todos os elos da cadeia”, diz.